Congresso amplia domínio sobre orçamento e parlamentares de Mato Grosso do Sul devem explicar R$ 60 milhões em emendas Pix
Durante a campanha de 2022, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a então candidata Simone Tebet criticaram duramente o avanço do Congresso sobre o orçamento federal. Lula acusou Jair Bolsonaro de entregar o controle do orçamento ao Legislativo, enquanto Simone classificou o orçamento secreto como “o maior escândalo de corrupção do planeta”.
Naquela época, deputados e senadores controlavam menos de R$ 19 bilhões. Agora, três anos depois, tanto Lula quanto Simone parecem aceitar o novo cenário. A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2026 prevê um valor recorde de R$ 53 bilhões destinados às emendas parlamentares — um movimento inédito no mundo em termos de concentração de poder legislativo sobre o orçamento. Cada parlamentar poderá, em média, gerenciar cerca de R$ 89,2 milhões.
Se a distribuição fosse uniforme, a bancada de Mato Grosso do Sul teria direito a cerca de R$ 981 milhões. Contudo, levantamento da Transparência Brasil, solicitado pelo Campo Grande News, revela que oito parlamentares do Estado, 31 prefeituras — incluindo a de Campo Grande — e o governo estadual ainda não prestaram contas de aproximadamente R$ 60 milhões em emendas Pix.
Esse modelo de repasse, caracterizado por baixa transparência e rastreabilidade, deveria ter suas despesas comprovadas até o final de 2024. Para 2025, já estão previstos mais R$ 7,3 bilhões em emendas Pix, mesmo com o modelo sendo alvo de investigações da Polícia Federal, após o ministro Flávio Dino acionar o STF para tentar barrar a prática.
Entre 2019 e 2024, o Congresso administrou, sem prestar contas, R$ 186,7 bilhões em emendas — o que, segundo especialistas, gerou um grave desequilíbrio entre os poderes.
MS e as emendas Pix — De acordo com o levantamento, o senador Nelsinho Trad (PSD) lidera a destinação de recursos via emendas Pix para Mato Grosso do Sul, com R$ 27,2 milhões. Desse total, R$ 12 milhões foram para o governo estadual e R$ 8,8 milhões para a Prefeitura de Campo Grande. Municípios como Angélica, Naviraí e Sete Quedas também receberam valores entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões. No entanto, há comprovação de apenas R$ 67 mil de uma emenda de R$ 4 milhões para Ivinhema.
O segundo maior montante vem do deputado Rodolfo Nogueira (PL), com R$ 12 milhões — sendo R$ 10,5 milhões para o Estado e R$ 1,5 milhão para a Capital. Já o deputado Beto Pereira (PSDB) destinou R$ 9,8 milhões para dez municípios, com destaque para Terenos.
O deputado Luiz Ovando (PP) encaminhou R$ 5 milhões, a maior parte para São Gabriel do Oeste. A senadora Soraya Thronicke (Podemos) destinou R$ 3,5 milhões, sendo Miranda a principal beneficiada. Procurada, Soraya não respondeu.
Com volumes menores aparecem Camila Jara (PT), com R$ 1,5 milhão para Campo Grande; Dagoberto Nogueira (PSDB), com R$ 1 milhão para Antônio João; e Marcos Pollon (PL), com R$ 280 mil para Dourados.
Embora a LDO de 2024 fixe o dia 31 de dezembro como prazo para prestação de contas, o Ministério da Gestão e Inovação interpreta uma norma do TCU permitindo a entrega até 30 de junho do ano seguinte, o que vem sendo visto como uma manobra para evitar tensões com o Congresso.
Orçamento desequilibrado — A diretora de programas da Transparência Brasil, Marina Atoji, afirma que as emendas Pix seguem funcionando como um “cheque em branco” para os parlamentares. Segundo ela, o Congresso passou a exercer funções que deveriam ser exclusivas do Executivo, como o planejamento e a execução de políticas públicas, sem critérios claros na distribuição dos recursos.
O projeto da LDO de 2026 prevê R$ 122,2 bilhões em despesas discricionárias, sendo que R$ 56,5 bilhões estão reservados para emendas. Com o crescimento das despesas obrigatórias, o governo já projeta déficits cada vez maiores, podendo chegar a R$ 154 bilhões em 2029, comprometendo investimentos em áreas essenciais como saúde e educação.
Em entrevista ao Campo Grande News, a ministra Simone Tebet negou falha de planejamento e disse que o governo continuará sendo rigoroso no controle de gastos para garantir recursos para investimentos públicos. Simone reconheceu, no entanto, que será necessário cortar desperdícios para atender às exigências constitucionais em saúde e educação.
Curiosamente, mesmo após tantas críticas, o MDB, partido de Simone, garantiu o segundo maior volume de emendas de comissão para 2025: R$ 2,5 bilhões — um modelo que dificulta a identificação dos responsáveis pelas indicações e já foi apontado como foco da crise institucional recente.